O cenário é conhecido. Quem não passou uma noite sem dormir, pensando em problemas? O sono não vem, as preocupações aumentam, você levanta, vai tomar uma água, tenta ler um livro soporífero, mas nada funciona. Então você vai até armário da sua avó e "pega emprestado" um remedinho para dormir. Ainda demora um pouco, mas finalmente adormece. No dia seguinte , você tem outro problema, não consegue levantar e fica sonolento o dia inteiro.
De acordo com as bases biológicas e neuroquímicas, os benzodiazepínicos(BZD) ocupam receptores gabaérgicos , distribuídos no cérebro , com propriedades depressoras do Sistema Nervoso Central(SNC). Esses medicamentos aumentam o influxo de íons cloro nos neurônios, causando um bloqueio do potencial de ação, o que impede os disparos neuronais. O mecanismo produz então efeito hipnótico, relaxante muscular, ansiolítico e anticonvulsivante.
Esses medicamentos são úteis se bem escolhidos pelo médico e usados por períodos curtos para corrigir as insônias que acompanham os diferentes transtornos mentais. Entretanto, o uso prolongado, sem a supervisão médica, leva à dependência física e mental, com efeito rebote, nas tentativas abruptas de suspensão do uso. Também é bastante comum os pacientes perambularem por diferentes médicos em busca da sua receita azul.
Existem pessoas que sofrem demasiadamente com preocupações excessivas e ruminações mentais. Esses padrões de funcionamento mental podem acometer a todos em vários momentos de nossas vidas, frente a estressores internos e ambientais. Quando esses padrões mentais se tornam frequentes e intensos, estamos diante de um funcionamento anormal, com sofrimento psíquico e físico prejudiciais ao bem-estar do indivíduo.
O que pode desencadear essas preocupações excessivas e ruminações mentais?
As principais causas são os trantornos mentais do cluster dos Transtornos de Ansiedade e também os traços de Personalidade Anancástica( obsessivo-compulsiva). Obviamente que outras condições mentais e psicológicas produzem uma gama de sintomas, dentre os quais as preocupações e ruminações, mas para fins de compreensão geral, vamos focalizar esses dois transtornos principais.
Preocupações Excessivas são ideias, pensamentos, imaginações, medos , que antevem perigos reais ou imaginários. A emoção primária frente ao desconhecido ou a desfechos arriscados, que infligem dor ou perda futura, é a ansiedade. As preocupações excessivas compõem o que denominamos ansiedade psicológica. "Anxious", de onde deriva o vocábulo ansiedade, significa, aperto, asfixia, angústia. O termo é adequado, pois além dos pensamentos antecipatórios negativos e catastróficos que acompanham as preocupações excessivas, pode haver sintomas físicos , o que denominamos ansiedade somática, e incluem palpitações, sudorese nas mãos e pés, tensão muscular, dores no corpo, dificuldades de digestão, aperto no peito, falta de ar e tremores.
Ruminações Obsessivas são as preocupações excessivas em nível mental, repetitivos, circulares e recalcitrantes, de diferentes conteúdos, constantes , que invadem e ocupam toda a reserva mental. As ruminações obsessivas não cessam com a argumentação lógica interna ou externa que demonstram a improbabilidade dos cenários temidos. O indivíduo continua a ter pensamentos parasitários, sempre envolto por dúvidas, medo de perdas e riscos. O sofrimento leva a um esgotamento de neurotransmissores importantes para o bom funcionamento mental. Essa "desmoralização" silenciosa vai enfraquecendo os mecanismos de defesa psicológica, levando a várias doenças mentais, entre elas os transtornos depressivos e ansiosos. Em nível corporal( fisiológico), o pensamento tem o poder de ativar diferentes cascatas hormonais, como o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, com dois hormônios do estresse- cortisol e adrenalina, deletérios para o equilíbrio psicofísico( homeostase) a longo prazo.
Nenhuma pessoa é imune a preocupações e ruminações. Mas se essas condições se tornam crônicas, a busca de tratamento médico é recomendada. Há duas abordagens complementares. Uma abordagem é a prescrição de medicamentos que vão regular os níveis de neurotransmissores responsáveis pelos sintomas psicológicos e físicos. Além dos benzodiazepínicos já citados, os antidepressivos inibidores da serotonina possuem uma ação bloqueadora de receptores serotoninérgicos, reduzindo a ansiedade, a irritabilidade, as preocupações e as obsessões. Mesmo com a redução dos sintomas, muitos outros resistem à melhora, pois estão na estrutura de personalidade e não somente na neuroquímica anormal. Neste caso, a intervenção com técnicas cognitivo-comportamentais e técnicas de relaxamento são indicadas.
A associação medicamentos e psicoterapia produzem resultados sinérgicos e funcionam melhor do que aplicados isoladamente. Em casos de manifestação ansiosa aguda, os medicamentos têm ação mais rápida e aliviam o sofrimento. Em casos de constituição de caráter, a abordagem das crenças irracionais subjacentes à produção de sintomas torna-se o foco de tratamento. Tratar a causa produtora das preocupações e ruminações produzirá benefícios a médio e longo prazo, prevenindo novas emoções similares no futuro. Uma vez aprendida a lição, as estratégias de enfrentamento em situações similares no futuro, provam ser capazes de controlar os sintomas.