domingo, 29 de novembro de 2009

Como se Instalam as Fobias- Outras causas



Falamos do modelo de Rachman. Mas existem outras explicações para as fobias específicas? Sim, existem. No modelo não-associativo, de Poulton et al, 2002, não haveria necessariamente uma associação de estímulo e resposta na instalação de fobias. Segundo esse modelo, uma pessoa com medos inatos, que são determinados geneticamente, quando expostos a situações naturais não-aversivas, sofrem uma extinção do medo no decorrer do tempo. Seríamos protegidos de desenvolver fobias toda hora. Um bebê brinca com o cachorro e se acostuma a considerar o cachorro um "estímulo neutro". Quanto mais experiências neutras tivéssemos na infância, menos fóbicos seríamos. Agora, pegamos um indivíduo predisposto geneticamente a ter medos, e esse indivíduo não tem a oportunidade de se expor naturalmente aos diferentes estímulos neutros( déficit), então ele pode desenvolver fobias! A insuficiência de exposição natural causou uma baixa auto-eficácia para lidar os estímulos neutros.

Somos evolutivamente preparados para desenvolver medo, porque o medo nos ajudou a sobrevivermos. Imagine na época das cavernas, você se expor ao ambiente hostil, com risco de ser devorado por um tigre! Qualquer coisa parecida com tigre nos dias atuais dispara nossa amigdala cerebral. Isso é adaptativo.

A pessoa vem de uma família de tímidos( altamente hereditário). Aí nunca teve a oportunidade de dar uma aula, fazer uma palestra, quando se levanta na sala de aula para ler um trabalho, já começa a suar frio, a tremer. Depois disso,nunca mais tenta superar essa dificuldade. Ele acaba reforçando o medo de falar em público. Não falar em público é um reforço negativo( evitação), pois ele evita as reações de medo, mas reforça a baixa autoeficácia na comunicação verbal. A timidez que carrega nos genes foi reforçada negativamente pela evitação fóbica, confirmando a sua ineficácia como palestrante! Um ciclo vicioso mantenedor da fobia.

De voux, no livro cérebro emocional, defende a ideia de que existem memórias fóbicas inconscientes, registradas( inprint), em nível cerebral amigdaliano, com características pré-verbais, portanto inacessíveis à psicoterapia verbal. Esses registros mnêmicos seriam estáveis e resistentes. Não adianta argumentar contra eles, pois as memórias verbais surgem a partir dos 4 ou 5 anos de idade, com o desenvolvimento do hipocampo. Nesses casos, técnicas vivenciais( comportamentais) são extremamente eficazes.

Então , não esquecemos as memórias traumáticas? Não, não esquecemos as memórias traumáticas. Modificamos a valência( importância) dessas memórias na nossa vida. Aí sim a psicoterapia entra como fator de tratamento. Através da interação verbal com o psiquiatra, você cria novas conexões neuronais em nível de neocórtex( parte mais evoluída do cérebro) e essa região passaria exercer um controle dos disparos neuronais da amigdala. Os traumas continuam na memória primitiva, mas o cérebro inteligente bloqueia os disparos dessa região, inibindo a evocação das memórias.

Como se Instalam as Fobias?



Quando nascemos, alguns reflexos são inatos. Se pegarmos um bebê recém-nascido e o colocarmos de barriga para baixo, com o rosto contra o colchão, ele vai desviar o rosto reflexamente depois de alguns segundos( fuga da asfixia), para respirar. Se colocarmos nosso dedo na mão do bebezinho, ele vai prender( reflexo de prensão) , assim por diante. Esses reflexos herdados evolutivamente são os reflexos incondicionados.

Podemos produzir fobias em laboratório, como foi feito no experimento do "pequeno Albert", onde uma criança foi exposta a bichinhos aos quais não demonstrava nenhum medo. O pesquisador então começou a disparar campainhas estridentes toda vez que um animalzinho aparecia. O pobre Albert, quero dizer, pequeno Albert, desenvolveu fobia dos animais. Bastava aparecer um animalzinho, que ele entrava em crise de ansiedade. Isso foi documentado em vídeo.
O primeiro pesquisador que estudou esse tipo de condicionamento, foi Ivan Pavlov, um cientista russo. Ele denominou essa reação de condicionamento de dois estímulos pareados( emparelhados) de condicionamento clássico. No condicionamento clássico, um estímulo incondicionado é associado com um estímulo neutro, provocando uma resposta condicionada. Vamos a um exemplo: no caso do experimento clássico, foi feito com um cão. O cão salivava, quando estava com fome( reflexo incondicionado). Então o cientista pareou uma campainha( estímulo neutro) com a salivação e criou uma resposta condicionada. Depois, basta tocar a campainha , que o cão salivava.
Agora vamos entender uma fobia específica. Temos um estímulo incondicionado( autopreservação, medo da destruição) e temos um estímulo neutro( chuva e trovões). Numa situação específica, a pessoa pode ter passado por uma experiência ameaçadora para sua vida, durante uma tempestade e acabou "relacionando" o estímulo neutro com a ameaça de destruição. Agora toda vez que se prepara o tempo para chuva, o organismo reage como se fosse ser destruído! Está criada a fobia!
As fobias são generalizáveis. Isso quer dizer que a pessoa pode começar com um objeto ou situação e ir mudando para outros objetos e situações correlacionadas. Muitas vezes não conseguimos chegar à origem da fobia, pois ela se transmutou no decorrer dos anos. Um exemplo interessante é o medo de travesseiro( de pena), oriundo de uma fobia inicial de medo de galinha. Tanto o travesseiro como a galinha possuem penas!. Por isso, não nos interessa muito saber a origem das fobias, mas sim a causa das fobias, para introduzirmos os tratamentos!
Outros fatores contribuintes na instalação de fobias são o condicionamento vicário e a transmissão de informações.
No condicionamento vicário, o indivíduo aprende um comportamento pela modelagem. Durante a exposição a objetos e situações fóbicas, aprende por imitação. Essa teoria vem de Bandura( teoria da aprendizagem social). Se o modelo( geralmente pais e cuidadores), selecionam uma resposta fóbica, a criança copia esse comportamento, instalando no seu modelo mental.
Na transmissão de informações e instruções, através do discurso de modelos, a pessoa pode anexar informações verbais tendenciosas na sua representação mental, gerando ansiedade decorrente das distorções. Pessoas com fobia do trânsito ou viagens, podem ter sido "orientadas" exaustivamente quanto ao perigo de acidentes, morte nas estradas e outras tragédias. Isso reforça o medo cognitivo ,com magnificação do risco imaginário,muito diferente do risco estatístico.
Em suma, segundo a teoria de Rachman, os três possíveis caminhos para a instalação de uma fobia são: o condicionamento clássico, o condicionamento vicário e transmissão de instruções, agindo sinergicamente para a o resultado patológico.

Fobia do Número 8



As fobias são medos irracionais , persistentes e excessivos de objetos ou situações, causando uma conduta de esquiva( evitativa), gerando prejuízos funcionais na vida da pessoa.

Quando nos referimos a uma situação ou objeto, falamos de fobia específica. Quando nos referimos a uma situação de medo exagerado de exposição social, falamos de fobia social.

Qualquer pessoa pode desenvolver uma fobia no decorrer da vida. As fobias estão classificadas como transtornos de ansiedade e são muito prevalentes na população geral( 15 a 17%). A maioria das pessoas não procura ajuda psiquiátrica, porque "administra a sua fobia", até que alguma situação-gatilho provoque um prejuízo que não pode ser ignorado. Por exemplo, atendia uma paciente que tinha medo de lugares fechados( claustrofobia). Quando ia ao meu consultório , eu precisava deixar a porta e as janelas abertas, para que ela conseguisse se sentir tranquila durante a entrevista. Ela escondeu ,durante muitos anos, essa fobia. Mas quando teve que se submeter a uma cirurgia, começou a passar mal no bloco cirúrgico. Tenho pacientes que não andam de elevador. Sobem as escadas até o consultório. Outras não andam de elevador sozinhas. Existem mais de 400 tipos de fobias classificadas na literatura médica. Existe até fobia do número 8!
Por que isso acontece? O modelo explicativo para a instalação e perpetuação das fobias específicas envolve a integração de vários modelos causais. Haveria uma predisposição genética interagindo com o ambiente facilitador, através do condicionamento cognitivo e comportamental a determinadas situações, causando um "imprint"( registro fóbico) no modelo mental., principalmente numa região muito primitiva cerebral- a amigdala cerebral- .Toda vez que a pessoa entrasse em contato com o estímulo fóbico, haveria a reativação dos circuitos neuronais sensíveis, causando as reações de medo e ansiedade. Como o registro é em nível muito primitivo de memória, o tratamento das fobias específicas se faz com técnicas mais comportamentais de dessensibilização. Isto é, não adianta ficar tratando fobias específicas em nível cortical( pensamento), através da psicoterapia cognitiva ou psicodinâmica. O mais eficaz são técnicas comportamentais. No caso da fobia social, o uso de medicamentos está indicado.
Entre os tipos de fobias específicas, classificamos as fobias de animal, ambiente natural, sangue-injeção-ferimentos e situacional.
Nas fobias de animal, ambiente natural e situacional, o sistema nervoso autonômico simpático( noradrenalina) é ativado frente ao estímulo fóbico. Isso provoca ansiedade, palpitações, tensão muscular, boca seca, pupilas dilatadas, numa preparação para a reação de luta ou fuga.Em casos extremos de ansiedade, pode desencadear um ataque de pânico. Nas fobias que envolvem sangue-injeção-ferimentos, o sistema nervoso autonômico parassimpático sofre ativação( acetilcolina), provocando uma reação vagal( nervo vago), levando as pessoas a desmaiarem. Essas reações nervosas foram selecionadas evolutivamente, porque aumentavam nossa chance de sobreviver e perpetuar a espécie.