Esse é o título do livro de Thomas Wolfe. É também um comentário que ouço com frequência. Eles estão certos. Não se pode voltar para casa.
Se voltar para casa, terá que compactuar com "mentiras" para manter a imagem e a coesão familiar. Nenhum grupo social duradouro se mantém sem que seus membros mintam. Qualquer convivência emocional precisa de espaço. E falar a verdade o tempo todo sufoca, machuca. Principalmente as famílias disfuncionais, que estacionaram no tempo, que congregam membros com doença mental e transtornos de personalidade, necessitam dessa compensação para sobreviverem. Se você voltar para casa e tentar uma "conversa profunda", descobrirá que é inviável e perigoso para a homeostase familiar. Para que o amor-próprio coletivo se conserve e a sua imagem de boa filha, bom filho, excelente irmão ou irmã consiga um novo mandato, é preciso fingir coisas por mais quatro anos.
Por que funciona dessa maneira ? Primeiro, porque você cresceu! E os seus pais preferem enxergá-lo como aquela criancinha, bilu, bilu! Na palavra de muitos pais, " os filhos sempre serão nossas crianças, não importa a idade". Essa ideia aparentemente benigna esconde uma tentativa de não acompanhar a mudança dos padrões de relacionamento familiar à medida que o tempo passa. Todos perdem, porque quando uma pessoa ou grupo resiste a mudanças , deixa de evoluir. E a vida está em constante evolução. Outra consequência inevitável é o conflito. Nenhum adulto saudável aceita submeter-se à ditadura de outro adulto. Escutar ordens absurdas, pedidos inconvenientes, opiniões não solicitadas, sofrer controle ou invasão de privacidade foram compulsórios na infãncia, mas se tornam simplesmente intoleráveis no mundo adulto.
Voltar para casa e tentar uma "conversa profunda", em busca das verdades escondidas é transformar-se num algoz, um (a)filho(a) desnaturado(a). Você descobre que é um desterrado. Poucas famílias estão dispostas a aceitar novos padrões de relacionamento, seja por medo, preguiça ou incapacidade. Ou você desempenha o seu eterno papel de títere, restrito ao seu personagem no seio familiar, ou perderá a sua boa reputação construída em anos de obediência. Todos são proscritos na história familiar. Não se pode conservar uma boa reputação e falar verdades ao mesmo tempo.
Essa colisão transgeracional se deve a diferentes fatores. Pais se recusam a enxergar o ponto de vista dos filhos. Filhos se recusam a continuar obrigados a enxergar somente o ponto de vista dos pais. Esse beco sem saída responde ao diálogo aberto, quando todos os envolvidos estão dispostos a escutar verdadeiramente, baixando as defesas e abdicando da posse da "verdade". Escutar ativamente é o passo essencial. Instigar a curiosidade mútua, para saber em quem todos se transformaram, sem comparações com o passado ou com as expectativas irrealistas projetadas. Na verdade, esse cenário é a exceção, mas famílias saudáveis conseguem vivenciá-lo na maior parte do tempo.
Pais e filhos não se entendem, da mesma maneira que as pessoas não se entendem. Ninguém está disposto a escutar primeiro.
Nessa dualidade de comunicação, pais acreditam que sabem mais que os filhos. Afinal de contas, eles têm mais experiência, viveram mais anos, são mais sábios. Por outro lado, filhos acreditam que sabem mais que seus pais. Afinal de contas, estão se livrando daquelas ideias anacrônicas que foram obrigados a seguir durante anos. Dominam mais a tecnologia. Estão mais abertos ao mundo, às mudanças, ao novo.
Pais tentam impor suas crenças "aparentemente racionais". Eles as receberam de seus pais, que acreditavam na sua plausibilidade também. O problema das crenças é que elas são apenas crenças, não a verdade. Crenças antigas são menos capazes de sobreviver no mundo em constante mudança. Crenças são inflexíveis( até que o sujeito decida mudá-las deliberadamente). Mas os pais nasceram antes e esse hiato cronológico concede-lhes um poder precedente. Então, a crença de que experiência é sinônimo de sabedoria impele-os a doutrinar e exigir respeito. Filhos também carregam suas próprias crenças. Entre elas , "os coroas estão ultrapassados". Isso provoca uma cisão no processo de entendimento recíproco.
Pais tentam ensinar( impor) o seus códigos morais . O que eles acreditam ser certo ou errado. Filhos recusam a aceitar esses códigos morais, porque cada grupo possui códigos morais distintos. Crescer é mudar de grupo, de turma. Conservar os códigos morais dos pais é continuar no grupo familiar e não no grupo atual. Os pais que conseguem manter os filhos vivos até que tenham juízo e independência financeira, já são bem-sucedidos. Mais do que isso é superproteção danosa ao psiquismo humano. Enquanto pais e filhos não entenderem que vivem em grupos diferentes, com regras diferentes, com um "gap" geracional entre eles, nenhum diálogo amistoso e construtivo terá oportunidade de acontecer.
Não se pode voltar para casa, a não ser que essas considerações sejam entendidas e colocadas em prática.
Outro fator que gera mal-estar nas relações familiares é a tranferência do sofrimento psicológico individual para o grupo. Famílias que orbitam ao redor de um doente mental, um drogadicto, um alcoolista, um psicopata, um pródigo, são famílias disfuncionais. Um indivíduo desestrutura toda a família. Enquanto essa questão não for solucionada ou equacionada, todos os membros sofrerão coletivamente, carregando o sofrimento de um dos seus membros.
Basta uma pessoa insana para enlouquecer muitas pessoas. Inversamente, precisamos mobilizar muitas pessoas para controlar apenas um insano.
O caminho real geralmente não é o caminho sonhado ou desejado. Teremos que lidar com diferenças de opiniões. Isso é ótimo.
Péssimo para a maioria, será lidar com a indiferença quanto às opiniões diferentes. Nesse caso não vai haver diálogo, nem afinidade, nem crescimento. No seu lugar haverá a perpetuação do distanciamento entre pais e filhos.
Péssimo para a maioria, será lidar com a indiferença quanto às opiniões diferentes. Nesse caso não vai haver diálogo, nem afinidade, nem crescimento. No seu lugar haverá a perpetuação do distanciamento entre pais e filhos.
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