segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Qual o risco de usar antidepressivo em pessoas normais?

Um estudo feito pelo Instituto de Psiquiatria da USP, entitulado "Estudo psicológico da regulação emocional a partir dos efeitos de antidepressivos" avaliou 120 voluntários rigorosamente saudáveis, que usaram antidepressivo por 12 semanas, em subdoses ( 40 mg/dia), enquanto a dose habitual é 75 mg/dia.

Os pacientes observaram uma diminuição na irritabilidade, com ganho de maior tolerância frente aos estressores. Os fatores analisados foram: agressividade, sono, funcionamento cerebral e alimentação.
O estudo comparou voluntários que usaram placebo( pílulas sem efeito terapêutico) com os voluntários que usaram o antidepressivo verdadeiro. Em 30 % dos casos, os participantes notaram melhora do humor nas semanas que usaram o antidepressivo verdadeiro. Eles passaram a se irritar menos e ficaram mais concentrados nas tarefas. Parece que os traços de personalidade que responderam ao medicamento demostraram ser importantes, pois os pacientes respondedores eram menos medrosos, irritáveis e impulsivos.
Obviamente que o objetivo desse trabalho não é preconizar o uso de antidepressivos para pessoas saudáveis. Mas demonstra que os antidepressivos podem ser reguladores de traços de personalidade. Trabalhos anteriores demonstraram que os antidepressivos antagonizam os efeitos estressores dos hormônios cortisol e adrenalina, protegendo a sáude da região hipocampal, responsável pela memória e aprendizagem.
Na prática clínica, muitos pacientes que não satisfazem os critérios para Transtorno Depressivo Maior(TDM) ou Transtorno de Humor(TH) respondem a baixas doses de estabilizadores de humor e antidepressivos. Esse trabalho vem confirmar a experiência de consultório. Entretanto continuamos a reforçar que o uso indiscriminado de psicotrópicos pode causar malefícios e não somente benefícios. Sem um acompanhamento psiquiátrico regular, o risco é maior do que o benefício.

Mudanças bruscas de humor

Estado emocional de uma pessoa é composto do humor e do afeto. O humor é uma tonalidade emocional mais duradoura, estável no tempo, enquanto que o afeto é o estado modulado em curtos períodos de tempo, podendo variar em questão de minutos a horas. Na avaliação do estado mental(EEM), avaliamos a história longitudinal do paciente( ao longo de anos) e a história transversal( ao longo de horas a dias). Dessa avaliação podemos suspeitar de algum transtorno de humor, baseado nas características clínicas e na variabilidade dos sintomas.

Na avaliação do humor, podemos identificar : humor depressivo, humor ansioso, humor eufórico, humor disfórico, humor eutímico( na normalidade) e uma gama enorme de tons emocionais.

Na avaliação do afeto , podemos identificar: afeto depressivo, afeto ansioso, afeto eufórico, afeto disfórico, afeto eutímico e uma gama enorme de outros afetos.

Basicamente, numa avaliação psiquiátrica, conseguimos mapear esses tons emocionais e as suas oscilações, classificando o que é aceitável dentro do espectro de normalidade e o que é patológico nesse mesmo espectro. Esse "feeling" nos permite inferir que determinado paciente possa estar apresentando um transtorno de humor, que vai necessitar de tratamento específico.
Na avaliação do humor e do afeto, nos interessa a qualidade , a intensidade, a variabilidade, as repercussões funcionais na vida do paciente e o seu estado subjetivo de bem-estar.
Um paciente com Transtorno Depressivo(TD) manifesta humor depressivo e afeto geralmente depressivo, podendo variar numa gama enorme de tons, incluindo afeto ansioso e irritável( principalmente adolescentes e crianças).
Um paciente com Transtorno Afetivo Bipolar(TAB) manifesta humor depressivo ou eufórico, com afetos varíaveis, desde o depressivo, o disfórico, o eufórico, o ansioso até variantes mais graves, com o achatamento da variabilidade emocional( embotamento afetivo).

A pergunta que surge é : Como diferenciar o normal do patológico?

A avaliação cabe ao profissional de saúde mental, que vai aplicar a sua experiência clínica na formulação da melhor hipótese diagnóstica para o caso, baseado em evidências clínicas coletadas da história de vida do paciente, além da comprovação direta dos sinais alterados do Exame do Estado Mental(EEM), realizado durante a consulta psiquiátrica.  A experiência do psiquiatra é um diferencial, porque o atendimento de inúmeros casos vai burilando a percepção do médico na confecção diagnóstica mais acurada. Esse diagnóstico inicial( hipótese) vai ser acompanhado nas avaliações subsequentes, até haver uma sofisticação diagnóstica completa da situação, com confirmação diagnóstica a longo prazo. Mais importante do que a  velocidade na psiquiatria, primamos pela acurácia diagnóstica, porque disso vai depender o sucesso do tratamento.
O tratamento é direcionado à hipótese diagnóstica e pode obter sucesso terapêutico rápido ou demandar ajustes medicamentos de acordo com a evolução clínica de cada paciente. Nesta fase, muitos pacientes desistem do tratamento e acabam agravando a evolução do seu caso. Essas desistências decorrem da impaciência em esperar o efeito terapêuticos dos medicamentos ( que podem levar de 10 dias a 6 semanas, dependendo da classe medicamentosa), a busca imediata de resultados, a desmotivação para a investigação introspectiva, a influência de pressões preconceituosas vindas da sociedade desinformada. Os fatores de interferência no êxito terapêutico são muitos, mas se o paciente confiar nas orientações do médico e aderir ao regime de tratamento proposto, as chances de melhora são altas.



A normalidade em relação aos tons emocionais é a pessoa estar livre para transitar em diferentes estados emocionais, de acordo com a sua estrutura psicológica. Pessoas fixadas em humores constantes estão doentes, assim como pessoas fixadas em variações afetivas muitos intensas e rápidas estão doentes. Nesses casos, os tratamentos promovem um alívio sintomatológico substancial, além de protegerem o cérebro das repercussões negativas do desequilíbrio neuroquímico que acompanha essa oscilação.

DEPRESSÃO- Sinais e Sintomas


CHECKLIST PARA SINTOMAS DEPRESSIVOS:( se no período de duas semanas, cinco ou mais critérios estiverem presentes, sendo pelo menos um deles o critério 1 ou 2 ).

1-(   ) Humor depressivo na maior parte do dia, quase todos os dias-sensação de vazio, desesperança. ( em adolescentes, o humor pode ser irritável).
2-(   ) Acentuada diminuição do interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia, quase todos os dias.
3-(   ) Insônia ou hipersônia( excesso de sono) quase todos os dias.
4-(   ) Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta ou redução/aumento de apetite quase todos os dias.
5-(   ) Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias.
6-(   ) Fadiga ou perda de energia quase todos os dias.
7-(   ) Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada.
8-(   ) Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou indecisão quase todos os dias.
9-(   ) Pensamentos recorrentes de morte, ideação suicida recorrente.

** Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional  e em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
** O episódio não é atribuível a efeitos fisiológicos de uma substância ou outra condição médica.
** Outros transtornos mentais excluídos no diagnóstico diferencial.