domingo, 27 de dezembro de 2009

Enxaqueca e Outras Cefaléias



Na avaliação de um transtorno mental, as enxaquecas são possíveis marcadores. Não conheço nenhum enxaquecoso crônico que não tenha algum transtorno mental subjacente. Talvez seja um viés profissional. A minha conduta é : se apresenta quadro de enxaqueca, merece uma avaliação psiquiátrica completa. Sabemos que a enxaqueca possui mais de três mil causas descritas na literatura, mas as causas psiquiátricas se destacam entre elas. Essa percepção serve para os meus colegas médicos, quando atendem um paciente com enxaqueca.


A Enxaqueca é um tipo de cefaléia( dor de cabeça), geralmente pulsátil, de intensidade média a grave, acompanhada de alterações sensoriais e náusea, acometendo a fronte ou a lateral da cabeça. Causa sofrimento significativo. Podem ocorrer outros sintomas acompanhantes, como fotofobia( desconforto com a luz), parestesias( formigamentos no corpo). Ela é classificada em clássica e comum. Na enxaqueca clássica, a dor é precedida por sinais prévios, a aura, que inclui escotomas ( flashes luminosos, pontos cintilantes ou escuros, "estrelinhas") , rigidez, formigamento,dormências, dificuldade na fala e na coordenação motora. Na enxaqueca comum a aura está ausente. Nos dois tipos de enxaqueca pode haver um estágio inicial, conhecido por pródromo, com características como dificuldade de concentração, cansaço, oscilação de humor, sendo sucedido pela dor de cabeça propriamente dita. A cefaléia piora com o movimento, com barulhos, odores, sensibilidade na cabeça( região têmporo-parietal). O pródromo pode durar de horas a dias, a aura dura cerca de uma hora, a cefaléia dura de horas a dias, e o pósdromo, de horas a dias. As causas são multiplas, incluem fatores dietéticos, , como refeições irregulares ou alguns tipos de alimento, desidratação, cansaço físico, mudanças hormonais, estresse, ansiedade, depressão e mudanças climáticas ou ar abafado. Pesquisas mostram que pessoas com quadros de enxaqueca possuem o córtex parietal( responsavel pela sensações) mais espesso que a população em geral.


A Cefaléia Tensional é a dor de cabeça mais comum, geralmente produzida por contratura muscular do pescoço e do couro cabeludo. Nessa região temos os receptores para dor. A dor tende a ser constante, mas pode latejar também. Localiza-se na fronte ou é holocraniana( toda a cabeça). É acompanhada por tensão na região do pescoço, pressão atrás dos olhos, dificuldade de mobilização dos musculos do pescoço(contratura). As cefaléias tensionais são provocadas por estresse, que retesam os musculos da cabeça.


A Cefaléia em Salvas é concentrada ao redor de um dos olhos, que pode lacrimejar ou inflamar. São episódios rápidos e curtos de dor severa,de características lancinantes. A pessoa apresenta várias crises diariamente, de uma a quatro em média, seguidas por um período de cessação dos sintomas. A causa é desconhecida, mas se acredita que haja uma possível atividade anormal dos neurônios da região do hipocampo.


Nas cefaléias e na enxaqueca, os receptores de dor levam os estímulos álgicos até o tálamo e desse até o córtex sensorial, produzindo o circuito para a conscientização da dor.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Transtornos Fóbico-ansiosos

Os Transtornos Fóbico-ansiosos incluem os pacientes que apresentam ansiedade e fobia simultaneamente.
A ansiedade é uma reação normal frente a estímulos ameaçadores da nossa integridade física e mental. Torna-se um transtorno, quando aparece em situações não ameaçadoras, com intensidade desproporcional aos estímulos e causa sofrimento significativo.
O medo é uma reação normal frente a situações ameaçadoras da nossa integridade física e mental. Torna-se um transtorno( fobia), quando aparece em situações não ameaçadoras, com intensidade desproporcional aos estímulos e causa sofrimento significativo.
Quando o normal aumenta de intensidade e fica fora do controle do paciente, estamos diante de um quadro fóbico-ansioso. Ele se caracteriza pela presença de sintomas reativos de hiperestimulação adrenérgica[ ativação do eixo do estresse- hipotálamo/hipófise/adrenal, que secreta o hormônio adrenocorticotrófico(ACTH)] . Esse hormônio atua nas glândulas adrenais( em cima dos rins), produzindo adrenalina e cortisol. Ocorre uma resposta fisiológica de " luta ou fuga. A ativação crônica do eixo está relacionado com quadros crônicos de ansiedade.
A fobia é um medo irracional frente a estímulos que foram condicionados a risco. Existem mais de 400 fobias descritas na literatura médica. Por curiosidade, observe o nome de algumas fobias comuns:
a) Tipanofobia- medo de injeções ou agulhas
b) Ofidiofobia- medo de cobras
c) Cinofobia- medo de cães.
d) Carcinofobia- medo de câncer
e) Astrafobia- medo de raios e trovões
f) Aviofobia- medo de voar
g) Enoclofobia- medo de multidão

Transtorno Afetivo Sazonal( TAD)



O Transtorno Afetivo Sazonal(TAD) é um tipo de transtorno depressivo que ocorre em determinadas épocas do ano. A causa é desconhecida, mas se acredita que a mudança no nível de luminosidade possa alterar a química cerebral, afetando o humor. Geralmente a chegada do inverno traz depressão, cansaço, desânimo, necessidade de ingerir doces, ganho de peso, ansiedade, irritabilidade e isolacionismo social. Os sintomas desaparecem espontaneamente com a chegada da primavera. O SAD responde ao uso de antidepressivos e exposição à luz solar ou artificial. Para a confirmação diagnóstica os sintomas precisam recorrer num período de 2 anos consecutivos na mesma estação.

Transtorno Afetivo Bipolar(TAB) e Criatividade



O Transtorno Afetivo Bipolar(TAB) está muito presente em estudos biográficos de artistas. Ele é mais comum em artistas bem-sucedidos do que na população em geral. Por exemplo, o compositor alemão Robert Schumann( 1810-1856) produzia muito quando entrava em surto maníaco e menos quando estava depressivo. O seu número médio de composições entre 1829 e 1853 era de 3 por ano. No ano de 1840 , em pleno surto maníaco, produziu 24 composições. No ano de 1849 produziu 27 composições!

Vários artistas famosos apresentavam relatos de oscilação de humor, entre eles Vicent Van Gogh, Ernest Hemingway, Virgina Wolf e outros.

Doença de Alzheimer(DA)



A Doença de Alzheimer(DA) é a causa mais comum de demência( 80% dos casos). Trata-se de um quadro neurodegenerativo, progressivo, pelo acúmulos de placas de proteinas( beta-amilóides) nos neurônios, causando alterações na anatomofisiologia cerebral.


A doença é rara antes dos 60 anos de idade, mas é comum depois dessa idade, principalmente pelo aumento da expectativa de vida. A maior parte dos casos é de causa não identificável, mas há uma relação genética importante. Mutações de vários genes estão associados a ela. Em casos de manifestação tardia, ocorrem mutações nos genes responsáveis pela produção de uma proteína no sangue( Apoliproteina E), que regula a produção da proteína beta-amilóide. Com a destruição neuronal, o neurotrasmissor acetilcolina, importante em mecanismos de memória e transmissão dos impulsos nervosos para os músculos, sofre uma diminuição em nível cerebral. Estima-se que há uma alteração concomitante do influxo do mineral cálcio para dentro dos neurônios, causando um quadro de neurotoxicidade, com destruição neuronal.

Os sintomas variam de pessoa para pessoa, mas seguem um curso tipicamente progressivo;


Estágio 1-A pessoa fica esquecida, por comprometimento de áreas cerebrais responsáveis pela memória, principalmente hipocampo.


Estágio 2- Há perda mais pronunciada de memória recente( dependente do hipocampo), com desorientação espacial e temporal, dificuldades de concentração, afasia( incapacidade de encontrar a palavra certa), ansiedade, instabilidade de humor e mudanças de personalidade.


Estágio 3- A confusão se agrava, com o surgimento de sintomas psicóticos, como delírios e alucinações. Com o comprometimento de áreas cerebrais superiores( corticais), há perda das capacidades motoras , com descontrole esfincteriano intestinal e vesical.


O tratamento consiste no uso de medicamentos inibidores da enzima anticolinesterase( que destrói a aceticolina) e a memantina( que bloqueia os canais NMDA, diminuindo o influxo de cálcio e prevenindo a neurotoxicidade). Os tratamentos não curam, apenas retardam a evolução da doença e previnem alterações comportamentais.

Demências

Demências são um grupo de doenças degenerativas cerebrais que se caracterizam pelo declínio cognitivo( memória, pensamento abstrato, planejamento) generalizado, além de alterações no comportamento.
As demências são causadas por diferentes alterações no tecido cerebral. A principal causa de demência é a Doença de Alzheimer(DA). Em segundo lugar, está a demência vascular, por déficit no fornecimento sanguíneo normal para os neurônios, provocando a morte celular. Um AVC( acidente vascular cerebral) é o principal fator etilológico da demência vascular. Podem ocorrer múltiplos infartos( morte por falta de sangue no tecido) em diferentes regiões cerebrais. Há ainda a demência por corpos de Lewy, onde ocorre uma degeneração dos corpos neuronais( que ficam arredondados). Muitas doenças podem produzir demências: AIDS, doença de parkinson, alcoolismo, carência de vitaminas, traumatismo cranio-encefálico(TCE), tumores cerebrais, encefalites( infecção do tecido cerebral), intoxicação medicamentosa, hidrocefalia.
As demências se caracterizam pela perda progressiva da memória, confusão mental e desorientação temporal e espacial. Também é possível a mudança do comportamento, que fica atípico, agressivo ou constrangedor. O paciente demenciado cria explicações para os seus sintomas( confabulação). Com o avanço dos sintomas, pode haver indiferença aos eventos externos, prostração, descuído completo com a higiene pessoal, necessidade de acompanhamento por cuidadores. Todos os tratamentos para demência são paliativos( retardam a evolução e aliviam os sintomas, mas não curam). O única forma de demência tratável com sucesso é a demência por hidrocefalia de pressão normal.

Paradigma Mente-Cérebro

Atualmente o Paradigma Mente-cérebro considera que todo o transtorno mental tem um padrão neuronal( cerebral) correspondente. Alterações nas sequências dos processos neurais causaria sintomas mentais patológicos.
Nem sempre foi assim. No estudo da evolução histórica dos transtornos mentais, desde a época de Hipócrates( pai da Medicina), a doença seria o resultado do desequilíbrios dos humores corporais: bile negra, bile amarela, sangue e fleuma.
Na idade média acreditava-se que a doença mental era causada por alguma perturbação do espírito( que sem mantém até os dias atuais em algumas culturas, inclusive brasileira). O demônio apoderava-se do espírito da pessoa, deixando-a depressiva ou insana.
Mais tarde, o médico Franz Mesmer descobriu o " magnetismo animal", que poderia causar a loucura, caso fosse bloqueado. O hipnotismo seria a maneira de controlar esse fluxo magnético.(daí surgiu o termo mesmerizado, magnetizado).
Posteriormente a Psicanálise tomou conta do cenário das doenças mentais, através de Sigmund Freud, que preconizou a existência do inconsciente e os seus conflitos geradores de doenças. Através da psicanálise, seria possível curar essas neuroses, conscientizando os conflitos emocionais reprimidos.
Transtorno mental é catalogado pelos manuais diagnósticos e estatísticos utilizados pela Psiquiatria. Toda vez que uma pessoa vivencia o mundo de maneira diferente das outras pessoas, a ponto de causar comportamento anormal, que prejudica o seu bem-estar pessoal e social, estamos diante de um transtorno mental. A definição dos transtornos é fenomenológica( descrição ateórica dos sintomas), com o agrupamento de classes de sintomas( síndrome), estendidos num tempo mínimo necessário para o diagnóstico psiquiátrico. Obviamente que a cultura influencia a classificação nosológica( das doenças). Dependendo da cultura, algo pode ser considerado normal ou patológico.
Em geral, os transtornos mentais são decorrentes de alterações no funcionamento cerebral( doenças funcionais), na estrutura anatômica cerebral( doenças degenerativas), causadas por trauma ou lesão cerebral, resultados da vulnerabilidade genética em associação interacional com o meio ambiente. Com o avanço da neurociência e aprimoramento dos métodos de neuroimagem, cada vez mais se estuda o paradigma mente-cérebro, procurando correlacionar as alterações entre ambos.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Hierarquia das Necessidades


Na década de 40, o psicólogo Abraham Maslow propôs uma Pirâmide de Necessidades humanas, organizada em degraus hierárquicos. Na base da pirâmide estão as necessidades fisiológicas( alimentação, abrigo, condições mínimas de vida), logo acima está a necessidade de segurança, depois mais acima a socialização, depois a autoestima e por fim , a autorealização.


Essa pirâmide é usada até os dias atuais para auferir o grau de funcionamento do indivíduo. A regra que ele estabeleceu diz que uma pessoa só pode subir um degrau, se tiver preenchido o degrau anterior, desde a base até o vértice superior. Isto é, se uma pessoa não atende as suas necessidades básicas( fisiológicas), dificilmente vai se envolver com atividades relacionadas à segurança. Se ele não preenche as necessidades de segurança, não vai buscar o pertencimento a grupos sociais. Sem a sensação de pertencimento, não poderá investir na sua autoestima. Sem autoestima, não poderá realizar-se!


Apesar do aspecto esquemático da pirâmide, clinicamente e sociologicamente, ela é uma ferramenta útil de avaliação e autoavaliação. Na virada do ano, proponho que você revise a sua Pirâmide de Necessidades e responda a algumas perguntas:


1) Você consegue atender às suas necessidades básicas- alimentação saudável, horas de sono, momentos de lazer, condições agradáveis de existência?


2) Você tem segurança em poder garantir o máximo de tempo( ou indefinidamente) essas condições ótimas de vida?


3) Você se sente protegido e livre o suficiente para dedicar-se a algum grupo social, maior que você?


4) Como está a sua autoestima? Sente-se valoroso para o mundo e para as pessoas ao seu redor?


5) Fazendo o que você faz hoje, sendo quem você é, consegue realizar-se integralmente?

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Diagnóstico Multiaxial na Psiquiatria

A Psiquiatria estabelece 5 eixos diagnósticos. No eixo I catalogamos as doenças mentais clínicas. No eixo II catalogamos o retardo mental e os transtornos de personalidade(TP). No eixo III catalogamos as doenças clínicas físicas. No eixo IV catalogamos os estressores psicossociais. No eixo V aplicamos uma escala global de funcionalidade no último ano.
Mantendo a tradição de abordagem ampla e holística, avalia o ser humano como um todo. O objetivo é estudar a correlação entre a mente, o corpo e os aspectos ambientais. Com essa visão multiaxial, pretende-se englobar o máximo de nuances diagnósticas, para prover um tratamento mais específico e eficaz possível.
Cada indivíduo é multidimensional. No processo diagnóstico precisamos coletar dados do perfil de sinais e sintomas( diagnóstico psiquiátrico e clínico- eixo I e III) , num corte transversal no tempo, além de elaborarmos um raciocínio histórico longitudinal( eixo I, II, III, IV e V). O processo demanda mais de uma sessão, podendo demorar meses para o esclarecimento psiquiátrico completo. Por isso, a importância do acompanhamento psiquiátrico regular a longo prazo. Quando há remissão dos sintomas agudos, o paciente já quer alta! Isso invalida a continuidade do processo completo de investigação diagnóstica.
A psiquiatria está ampliando os recursos diagnósticos a cada ano. Atualmente a maioria dos diagnósticos depende da percepção e experiência do psiquiatra, que foi adquirida no atendimento do maior número possível de casos clínicos. Mas já estão em investigação outros processos mais objetivos( neuroimagem, testes genéticos, testagem neuropsicológica). Portanto, atualmente , a qualidade do diagnóstico é proporcional à capacitação técnica e psicológica do psiquiatra. A psiquiatria atual é subjetiva, baseada em referenciais classificatórios objetivos( checklist).
Além da acurácia diagnóstica, torna-se importante o vínculo terapêutico com o médico. Além do vínculo, o profissional precisa ter habilidades atualizadas em psicofarmacologia. Com o surgimento de novas classes de medicamentos, o potencial de interação com outros medicamentos de outras especialidades, o domínio de dezenas de medicamentos é um habilidade técnica fundamental. Essa alquimia psicofarmacológica faz a diferença no sucesso ou fracasso terapêutico!

Transtornos Psiquiátricos Intratáveis pelos atuais Métodos Terapêuticos- Parte II

A Medicina não cura todas as doenças. Muitas delas são crônicas e demandam tratamento a longo prazo, com controle sintomatológico( remissão), mas sem a cura definitiva. Se os pacientes interrompem o tratamento, os sintomas reaparecem( recaída ou recorrência). Entre as doenças clínicas mais conhecidas dentro desse padrão estão a HAS( hipertensão arterial Sistêmica), a diabetes, a artrite reumatóide e outras. Na psiquiatria não é muito diferente. A maioria das doenças são incuráveis, mas conseguimos controle sintomatógico( remissão), através do uso de medicamentos ou psicoterapias a longo prazo.
Existem doenças , entretanto, que não conseguimos nem uma remissão total , nem um controle sintomatológico ideal. São os casos intratáveis na Psiquiatria, principalmente os transtornos de personalidade. Por estarem rigidamente estruturados na maneira de ser, pensar, comportar-se do indivíduo, é extremamente trabalhoso produzir mudanças. Demanda a voluntariedade do paciente( rara), a habilidade técnica do psiquiatra, o tempo prolongado de tratamento( ou contínuo), o que produz resultados pífios.
Entre os transtornos de personalidade difíceis( ou impossíveis) de alcançar resultados terapêuticos substanciais estão o transtorno de personalidade antissocial, paranóide, esquizóide e em menor grau( alguma resposta e melhora com o tempo), o borderline. Esses transtornos são tratáveis( porque precisamos tratar), mas os resultados observados são mínimos. Os três fatores necessários para o sucesso terapêutico geralmente não conseguem acontecer simultaneamente.
Outros transtornos recorrentes e pouco responsivos ao tratamento, com a tendência de permanecerem a despeito do tratamento são os transtornos somatoformes, os transtornos conversivo-dissociativos, alguns transtornos neuróticos( esses passíveis de tratamento com psicoterapia). Eles ocupam a mente e a vida do paciente, que passam a viver em função dos sintomas, desinvestindo de outros aspectos mais importantes da sua existência. A perda de tempo e de tranquilidade são sinais óbvios de doença!

Transtornos Psiquiátricos Intratáveis pelos atuais Métodos Terapêuticos






Muitos casos na psiquiatria são considerados intratáveis. Isto é, eles recebem tratamento, entretanto não apresentam melhora suficiente. São casos difíceis, pouco responsivos, com os pacientes fazendo algumas consultas e depois abandonando o tratamento. As expectativas são irrealistas e esses pacientes com transtornos graves de personalidade(TP) querem resultados imediatos, senão culpam o psiquiatra ou psicólogo!


Lidar com trantornos graves de personalidade(TP) é um dos maiores desafios da Saúde Mental. Existem profissionais que se especializam em trabalhar especificamente com esses pacientes difíceis. Mas pode ser uma experiência frustrante.


Logo no início das consultas, percebemos a gravidade do quadro. Casos que envolvem dependência de substâncias geralmente estão associados a transtornos graves de personalidade. Nos transtornos graves de personalidade, há um desvio dos traços de personalidade ou comportamento, com sobrecarga da família, da sociedade, dos cônjuges, comportamentos disruptivos, prejuízos pessoais e profissionais. Apesar do tratamento, os pacientes melhoram pouco ou não melhoram!


Alguns sinais de TP se fazem notar na postura, na comunicação verbal, no histórico de vida e nos resultados alcançados na vida até aquele momento. Vamos a alguns sinais e sintomas prevalentes em pacientes portadores de TP:
1)Uso de múltiplas drogas( uma pesquisa demonstra associação de usuários de drogas com TP em mais de 60 % dos casos). As drogas podem ser álcool, cocaína, maconha e outros;
2) Revoltas frequentes desde a tenra infância, com sinais de agressividade física e verbal, com abuso da confiança dos pais( '" minha mãe confiava em mim , enquanto eu festiava");
3) Envolvimento com a polícia ou transgressões- dirigir embriagado, envolver-se em acidentes de trânsito e atropelamentos( " Subi na calçada umas três vezes ");
4) Abandono das atividades acadêmicas ou subaproveitamento acadêmico;
5) Indefinições profissionais( " vou fazer concurso de qualquer coisa") ;
6) Gasto de tempo em atividades improdutivas( " minha especialidade é sair para caçar");
7) Problemas com autoridades( " eu apanhei da polícia, porque eu não aceito que me mandem");
8) Envolvimento com atividades ilícitas( " eu passava na boladinha, só na agiotagem");
9) Comportamentos manipulativos( " sou estrategista e vingativa");
10) Falta de coesão de Identidade( "Não sou 100%, pareço uma personagem");
11) Ausência de culpa( " não me arrependo das coisas").


sábado, 19 de dezembro de 2009

Ataque aos Vínculos e o Mal-estar nos Relacionamentos



Nossa autoestima deriva do narcisismo primário, aquele considerado saudável. Precisamos gostar de nós mesmos antes de gostarmos das outras pessoas. Nosso narcisismo se desenvolve durante o crescimento psicossexual. Primeiro, a criança não diferencia a mãe de si mesmo. Investe todo o seu interesse em si mesmo, principalmente em nível corporal. Nesse desenvolvimento, que transita por várias fases, a criança deposita os seus impulsos( pulsões) em partes do corpo( ego corporal), quando interage com o mundo ao redor. No primeiro ano de vida a criança tem a tendência de levar tudo à boca( fase oral do desenvolvimento), depois luta com o controle dos esfíncteres( fase anal), depois interage com as figuras parentais de maneira sexualizada( fase edípica). Como estamos investindo na autodescoberta corporal, nossos impulsos amorosos e agressivos estão voltados para o corpo. Depois nos separamos da figura materna( dessimbiose), e passamos a enxergar o outro.


O termo narcisismo secundário refere-se ao reinvestimento egóico secundariamente, com prejuízo das relações interpessoais( objetais, na palavra da psicanalista Melanie Klein). Pessoas narcisistas secundárias amam-se demais em detrimento da heterovalorização. Portanto, são frágeis, pois o investimento em si mesmos tenta compensar a insuficiência do narcisismo primário. Déficits de cuidado materno( mãe insuficientemente boa, nas palavras do psicanalista Bion) causam uma enorme carência afetiva nas crianças, que se transformam em adultos narcisistas.


Todos temos algumas feridas narcísicas no nosso desenvolvimento, então todos temos alguma necessidade de compensação narcisista secundária. Quando a compensação é global, estamos diante de uma estruturação narcísica de personalidade, o transtorno de personalidade narcisista. A autoestima saudável é filha do narcisismo primário. O narcisismo secundário é filho das feridas narcísicas oriundas do desenvolvimento psicossexual.


Dito tudo isso, vamos ao tema "Ataque aos Vínculos e Mal-estar nos Relacionamentos". Se uma pessoa está carente, ela busca suprir essa falta na relação com os outros ou consigo mesma. Então todos necessitamos de vínculos. Entre esses vínculos estão o de amor, de ódio, de conhecimento( descritos por Bion) e o de reconhecimento. Reconhecer alguém é deixá-lo " voltar a acontecer( re- conhecer), é olhar para as qualidades do outro, é ser valorizado pelas qualidades e perdoado pelos defeitos. Todos necessitamos de vínculos, e o de reconhecimento dá à nossa autoestima ,permanentemente em construção , o direito de expressar-se no palco da vida. Queremos ser valorizados como pessoas autônomas, aceitas e dignas de amor!


Mas como vivemos numa sociedade narcisista, onde as pessoas estão carentes de reconhecimento, há uma escassez no mercado emocional, com as pessoas atacando os vínculos e causando mal-estar nos relacionamentos. A namorada narcisista precisa de atenção, por isso não pode dar atenção para o namorado narcisista. A amiga fica com inveja da amiga que recebeu um " quinhão maior de reconhecimento", seja afetivo, profissional ou financeiro. Começam as fofocas e ataques aos vínculos, com estremecimento e rompimento de relações.


Na situação psicoterápica acontece o mesmo. Muitas vezes trabalhamos o vínculo de conhecimento com o analisando e logo ele ataca a terapia( abandona, não paga, desaparece, etc). Quando lidamos com o vínculo de conhecimento e reconhecimento, lidamos também com os vínculos de amor( idealização) e ódio( desvalorização). A vida é um palco psicoterápico informal, onde os papéis se alternam, com múltiplos ataques aos vinculos reciprocamente.


Acredito que as patologias neuróticas são determinadas em grande parte pela patologia dos vínculos. Lembre-se " para existir, a estrela depende do olhar dos outros." Muitas pessoas passam a vida como seres inexistentes de reconhecimento. Outros passam a vida buscando o reconhecimento. Alguns desenvolvem falsas personalidades( falso self, cunhado pelo psicanalista Winnicott) para beber na fonte do reconhecimento dos pais, da sociedade, dos pares. Não ser reconhecido desde criança causa muitas feridas no self( eu). A criança persegue ideais dos outros, calcada em discursos que nada dizem respeito à sua essência individual e intransferível.


Todas as pessoas bem-sucedidas nas suas áreas de atuação levaram o narcisismo primário ao limite da aceitação e ainda utilizaram um pouco ( ou bastante) do narcisismo secundário. Reconheça essas pessoas( elas precisam), para reforçar o self frágil, eventualmente. Essas pessoas são rechaçadas, invejadas, humilhadas, criticadas, porque precisam dos "holofotes" para se sentirem vivas na existência. Muito do teatral e dramático é para chamar a atenção para a necessidade de vínculos. Escolha criar o vínculo, não atacá-lo! Todos somos feitos da mesma malha, se um elo se rompe a malha se desfaz. Para diminuir o narcisismo do mundo, precisamos valorizar os narcisistas, porque eles poderão valorizar outros narcisistas, até que todos sejam menos sedentos de reconhecimento , mais felizes e mais generosos! A psicoterapia ensina perceber o narcisismo secundário e a diminuir sua sede! As boas relações( trocas mutuamente satisfatórias) ensinam que temos reconhecimento verdadeiro , sem precisar pensar nisso a todo instante.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Transtornos de Conduta


Os Transtornos de Conduta são comportamentos psicopáticos perpetrados por pessoas abaixo dos 18 anos de idade. A partir dos 18 anos de idade, a classificação transforma-se em trantorno de personalidade antissocial.


Nesses adolescentes ou pré-adolescentes infratores, observamos um padrão repetitivo e persistente de desrespeito às regras sociais, com violação do direito dos outros . Há ameaças a pessoas e animais, com intimidações, lutas corporais, crueldade física, utilização de arma e roubo. Além disso, podem ocorrer destruição de patrimônio, furtos, invasão de propriedades, permanência na rua à noite, desobedecendo aos pais, fugas de casa, gazetas, mentiras frequentes, envolvimento com o crime.


Para o desespero das famílias, esses padrões disfuncionais de comportamento se mantêm na vida adulta e são resistentes às intervenções terapêuticas. Os comportamentos iniciam na infância ou adolescência e precisam estar presentes nos últimos doze meses para a confirmação diagnóstica.


Adolescentes infratores são encaminhados aos conselhos tutelares ou a instituições de reabilitação infanto-juvenil, com a vigilância dos monitores. A partir dos 18 anos, a legislação permite a soltura desses infratores, com a ficha criminal totalmente limpa. A maioria continua na senda da criminalidade e da toxicomania.


Quando o transtorno de conduta afeta famílias adotivas, a genética desconhecida do adotado começa a se manifestar em algum momento no tempo. Fatores genéticos são muito fortes na determinação do comportamento antissocial. Por não saberem da genética predisponente, muitas famílias pagam o preço alto de ter adotado uma criança com transtorno de conduta, manifesto tardiamente. Isso traz uma carga emocional brutal para todos os membros da família. Outras famílias já são disfuncionais e criam um ambiente negativo e permissivo que desencadeia comportamentos antissociais precoces, reforçados pela identificação com os pais infratores.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

"Controle a sua Insulina, tenha força de Vontade!"



"Controle a sua insulina, tenha força de vontade!". Quando familiares, vizinhos, "amigos", conhecidos, "médicos sem diploma" dão conselhos aos pacientes, geralmente mais prejudicam do que ajudam. Isso decorre da ignorância acerca das doenças mentais e da Psiquiatria como especialidade médica.


O que lhe parece a frase acima? Absurda? Engraçada? Ilógica? Pois saibam que a caravana de opinadores contra a Psiquiatria, contra o tratamento das doenças mentais não percebem que "exigem" ou " aconselham" os pacientes com transtornos psiquiátricos a terem força de vontade e controlar a neurotransmissão do cérebro. " Controle a sua serotonina, tenha força de vontade!" Faça uma forçinha, melhore a sua dopamina! Você precisa se ajudar!"


Por mais absurdo que seja isso, é exatamente o que os leigos desinformados em relação às doenças mentais e à Psiquiatria defendem. Culpam pacientes, aconselham a não ir ao psiquiatra, porque é "médico de louco". E por conta desse preconceito, muitos pacientes pagam o preço alto de retardarem a avaliação especializada, piorando a evolução das suas doenças e a saúde presente e futura de seus cérebros!


Ninguém tem preconceito de ir ao endocrinologista, aplicar a insulina diariamente para substituir a função deficitária do pâncreas. Também não vejo preconceito em ir ao cardiologista buscar tratamento para a pressão alta. Nunca vi alguém dizendo: " Controle a sua pressão arterial, tenha força de vontade!" Mas quando envolve a saúde mental, a lógica desaparece e o preconceito prevalece. Preconceito é toda e qualquer conclusão prévia ao conhecimento total ou suficiente de algum assunto. Quando o paciente aceita ajuda psiquiátrica e os sintomas desaparecem e as doenças ficam controladas, o preconceito desaparece! Pois agora ele tem conhecimento suficiente do assunto em questão, seja depressão, ansiedade, alcoolismo, transtorno bipolar, reação aguda ao estresse, etc. Entre as causas da profusão de preconceitos, está o modelo psicológico( com múltiplas teorias do funcionamento mental), o que inexiste nas especialidades médicas que lidam com a parte exclusivamente física( organicista). A Psiquiatria ficou 40 anos excluída dos avanços médicos, com o domínio da Psicanálise, até retornar à Medicina através da Psiquiatria Biológica a partir da década de 70.


Todos os dias lidamos com os "opinadores de plantão". Eles aconselham, contraindicam, recomendam, sem terem frequentado a faculdade de Medicina. Quando preciso resolver pendências legais, contrato um advogado, não vou me orientar com o joalheiro. Quando preciso organizar as minhas finanças pessoais, não vou ao gerente de banco( rsrss), consulto um economista amigo meu ou um consultor financeiro certificado. O mesmo raciocínio se aplica quando lidamos com o nosso bem maior, a Saúde!

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Entendendo o Suicídio



O Suicídio é um ato extremo ,frequente em diferentes transtornos psiquiátricos, que incluem os transtornos depressivos, bipolares, alcoolismo, esquizofrenia , uso de drogas e transtornos graves de personalidade.


Os determinantes do suicídio podem ser psicológicos e biológicos. A diminuição de metabólitos da serotonina foram encontrados no sangue de paciente suicidas, denotando uma desregulação serotoninérgica. Pacientes com concentração baixa de serotonina demonstram mais tentativas de suicídio e descontrole de impulsos. O descontrole de impulsos está presente em diferentes doenças psiquiátricas, o que pode ser um fator comum na precipitação do suicídio.


Salvar a vida do paciente é sempre a prioridade, com a indicação de psicofarmacologia agressiva, pois a psicoterapia é insuficiente para o controle da ideação suicída. Num estudo comparativo em 1978, apenas 16% dos pacientes obtiveram resultados positivos em psicoterapia quando severamente depressivos, enquanto 83 % responderam ao uso de psicofármacos. A internação psiquiátrica está indicada, quando a família não consegue prover suporte de vigilância 24 horas por dia ou os sintomas psicóticos são muito intensos que contraindiquem uma internação domiciliar.


As motivações para o ato suicida são múltiplas e variadas. Os psiquiatras e os médicos em geral devem sempre valorizar indícios de impulso suicida. Trabalhos demonstram que o paciente suicida comunicou a ideação a familiares ou médicos, em média, 6 meses antes da tentativa fatal. Cabe ao médico escutar atentamente e inquirir diretamente o paciente quanto à vontade suicida( isso não aumenta o risco, pelo contrário alivia a culpa e sofrimento e previne tentativas).


Na compreensão psicológica , vários autores clássicos e alguns contemporâneos estudaram as motivações inconscientes para o suicídio. O suicídio seria uma tentativa de matar a representação de uma pessoa dentro de si. A experiência clínica demonstra que o suicida tenta destruir a vida dos sobreviventes. É muito comum um ato homicida contra um cônjuge, seguido do ato suicida. Há em comum o desejo de matar, ser morto e de morrer, segundo karl Menninger.

Fenichel observou( 1945) que havia fantasias de reunião com uma pessoa amada perdida ou entes queridos que já faleceram. Em pacientes depressivos, cometer suicídio pode ser uma tentativa desesperada de fazer cessar a "dor psicológica", carregada de desesperança em relação ao futuro. O paciente enxerga-se como defeituoso, com o mundo contra ele e com as pessoas pouco se importando com o seu valor pessoal.


Em 1978, no suicídio em massa liderado pelo reverendo Jim Jones, suas últimas palavras foram, " mãe, mãe..", denotando uma fantasia de retorno à figura materna. Entre os principais fatores preditivos do suicídio, sete se destacam no período de 1 ano: ataques de pânico, ansiedade psíquica, perda do prazer e interesse nas coisas e pessoas, rápida mudança de humor, abuso de álcool, concentração diminuída e insônia global. Fatores de risco a longo prazo incluem tentativas prévias de suicídio, desesperança, ideação suicida recorrente. Os homens suicidam-se mais( usam métodos mais violentos, como armas de fogo e enforcamento) e mulheres tentam mais( uso de medicamentos).


Entre os fatores psicossociais que aumentam o risco estão as seguintes características: ser homem, solteiro, idoso, adolescente, sem suporte social, com doenças crônicas e sem tratamento psiquiátrico, principalmente para os transtornos de humor. Entre as características psicológicas adicionais, encontramos uma incapacidade no indivíduo de ser independente, uma visão ambivalente da morte, expectativas exageradas a respeito de si mesmo e o controle excessivo do afeto, com repressão da raiva.


O Suicídio é um problema de saúde pública. O tratamento das doenças psiquiátricas ainda é o melhor método preventivo do ato suicida. O lítio( estabilizador de humor) é um medicamento que mostrou eficácia na redução dos índices de suicído. Lembro-me do caso de um paciente com transtorno depressivo crônico, já no seu terceiro episódio. O clínico geral tirou o medicamento prescrito pelo psiquiatra, alegando que ele estava "curado". A doença agravou-se e o paciente matou-se por enforcamento. Parar com os medicamentos psiquiátricos aumenta a recaída das doenças e os índices de suicídio. Recusar-se a procurar ajuda psiquiátrica por preconceito ou desinformação aumenta o risco de suicídio em pacientes vulneráveis. Nunca vamos reduzir o risco de suicídio em 100 %, mas vamos minimizar o risco num percentual significativo dos casos. Vidas serão salvas!! Pense nisso! Fique atento! A informação salva vidas!

Antidepressivos e Disfunção Sexual



A depressão é um trantorno que causa disfunção sexual. Um dos sintomas presentes na síndrome é a diminuição da libido e disfunção erétil. Quadros ansiosos também causam alterações sexuais. O estresse crônico, pela secreção de hormônios vasoconstritores, como a adrenalina, provocam diminuição do fluxo sanguíneo na região irrigada para a ocorrência da ereção ou lubrificação vaginal.

Se a pessoa ainda abusar de álcool, for tabagista, usar medicamentos anti-hipertensivos, for diabético, for sedentário, o risco de disfunção sexual multiplica-se.


Em nível cerebral, a alteração dos neurotransmissores contribui para a disfunção sexual. Trabalhos comprovam a participação da serotonina e da dopamina em sistemas reguladores do desejo sexual. São justamente esses neurotransmissores que se encontram alterados em quadros depressivos e ansiosos. Quando regulamos esse sistema de neurotransmissão, o desejo sexual e a potência sexual se normalizam. Entretanto, os antidepressivos podem piorar a disfunção sexual, principalmente os inibidores da recaptação da serotonina(ISRS). Por atuarem em diferentes receptores cerebrais, podem inibir justamente aqueles envolvidos com o impulso sexual. Os efeitos colaterais sexuais com o uso de antidepressivos pode acometer até 1/3 dos pacientes tratados.


Dos antidepressivos disponíveis no mercado( 39 medicamentos), apenas três apresentam um potencial mínimo ou nulo de causar disfunção sexual. Quando o paciente se queixa de disfunção sexual, torna-se necessária a substituição do medicamento, inclusive testar outra classe medicamentosa que não afeta a função sexual. Apenas três medicamentos é insuficiente ainda, porque além de evitar a disfunção sexual, precisamos adaptar o medicamento ao perfil de sintomas do paciente. Isso acaba limitando bastante as combinações disponíveis. Os medicamentos mais modernos causam menos disfunção sexual, o que aumenta o percentual de sucesso na maioria dos casos.


Na fase aguda da doença depressiva, as mulheres aceitam tolerar os efeitos colaterais sexuais, mas a longo prazo isso torna-se inviável, porque uma vida sexual saudável e ativa faz parte da rotina da maioria dos casais. Os homens são pouco tolerantes a quaisquer disfunções sexuais, mesmo por curtos períodos de tempo. Portanto, um dos desafios do tratamento antidepressivo é compatibilizar a ação terapêutica dos medicamentos com a minimização dos efeitos colaterais em geral , e a disfunção sexual em particular.




domingo, 13 de dezembro de 2009

"Efeito Manada"



O termo "efeito manada" é muito usado no mercado de ações, quando um grupo de especuladores "estoura" numa direção de compra ou venda de algum tipo de ação negociada na bolsa de valores , pelo efeito psicológico do medo e da ganância.


Na psicologia não temos esse termo, mas ele pode ser pego emprestado para analisar o comportamento humano. Costumamos falar em superego, uma instância psíquica, criada pelo inventor da psicanálise, Sigmund Freud. O superego seria a nossa consciência moral, a vigilância social, os olhos dos nossos pais, a voz que nos cobra o certo e o errado. Pessoas muito rigorosas consigo mesmas teriam um superego "encorpado", rígido, o que as fariam representantes dos bons costumes sociais e da moralidade individual. Pessoas com superegos frágeis , seriam os psicopatas, que não respeitam as leis e as normas da boa convivência social.


Todos nós possuímos um superego. Ele é mais ou menos ativo no nosso psiquismo. Quanto mais adequada a nossa educação doméstica, melhor se posiciona nosso superego, nem num extremo , nem noutro. Pessoas com superegos muito rígidos, são vulneráveis a quadros depressivos, pois se cobram demais, são perfeccionistas demais, querem controlar demais o mundo! Pessoas com superegos fracos, são irresponsáveis demais, infantis demais, dependentes de regras para se orientarem na vida e não causarem confusão.


Voltando ao efeito manada. Existem grupos que diluem o superego das pessoas, liberando-as para fazerem coisas socialmente inaceitáveis, das quais se arrependem mais tarde. Veja o exemplo dos torcedores do Curitiba recentemente, dos alunos da Uniban recentemente. Em ambos os casos, o efeito manada diluiu a lucidez individual das pessoas, impulsionando-as a fazerem atos de selvageria no estádio e crucificando a aluna na Uniban. Outro exemplo de diluição do superego é o linchamento público. Pessoas , movidas pela permissividade de um grupo, podem linchar uma pessoa até a morte! Depois, quando voltam a si, já cometeram o ato bárbaro. A ingestão de álcool e drogas dilui o superego literalmente, pois afeta o funcionamento cerebral. No efeito manada, se mais de uma pessoa faz algo, as outras entram na onda, "tudo é festa", "tudo é carnaval", "se muitos estão fazendo, então é permitido". A mente individual crítica de cada um fica substituída pela mente coletiva permissiva para atos errados e selvagens!


Para que o efeito manada funcione, precisa haver outros ingredientes atuando simultaneamente. O anonimato é um deles. No estádio de futebol, não importa espancar o torcedor que você não conhece. Mas ele tem família, nome, é uma vida! "Coisificar" as pessoas facilita o efeito manada. Nos estádios, espancar torcedores, na bolsa de valores, comprar ações, nas universidades, atacar esteriótipos. O outro fator facilitador do efeito manada é a alegação de falsos motivos de ordem moral. Na cabeça da massa de manobra, é moralmente permitido linchar um assassino, pois ele matou uma pessoa. Mas continua errado matar o assassino. Jogar aviões em prédios continua um crime hediondo, mesmo com a chancela da religião( falso motivo divino).


O efeito manada funciona bem com massas de manobra. Como é uma espécie de terceirização da capacidade de pensar, pessoas pouco inteligentes costumam ser as vítimas do processo. Se houver líderes( chefes de torcida, investidores, líderes de turma) que mobilizam a imaturidade dos membros, mais fácil é "estourar" a boiada. Em nome de algum fanatismo, a permissividade se une com a falsa moralidade, levando a atos extremamente burros, brutais ou condenáveis. Obviamente que, quando passa o calor do momento, e os algozes recuperam a sua capacidade de pensar por si mesmos, arrependem-se do que fizeram, mas já é tarde, pois já estão na cadeia, perderam muito dinheiro na bolsa de valores ou denegriram a imagem da universidade. Quanto mais fraco o superego( infantil ou incompleto), mais regras ostensivas e vigilância externa são necessárias, para evitar que as pessoas não se comportem exclusivamente como animais, que um dia foi parte da sua natureza evolutiva e ficou latente no seus cérebros! Só que animais não frequentam estádios de futebol, nem se importam com dinheiro, nem atacam por inveja ou moralismo!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Transtorno Psicossomático

É a manifestação de queixas físicas em órgãos que são controlados pelo sistema nervoso autonômico( fora do controle voluntário). Os sintomas de excitação autonômica incluem palpitações, tremores, rubor, sudorese, com características persistentes. Os sintomas são subjetivamente relacionados a um órgão específico. Há uma preocupação e angústia quanto à possibilidade de um transtorno grave no órgão citado, sem nenhuma base. Os sintomas psicossomáticos mais comuns são: hipertensão arterial, gastrite e úlcera, colite ulcerativa, dermatites atópicas, asma, hiperventilação( puxamento de ar constante), urticária, dores inespecíficas, dificuldades digestivas, tosse.
No transtorno doloroso persistente ocorre dor persistente e angustiante, em sítios anatômicos, tendo como causa conflitos emocionais ou problemas psicossociais. A preocupação se converte em queixa física dolorosa mais comumente na cabeça, face, região lombar e região pélvica. Não é produzida pela pessoa nem simulada. Não é consequência de outros transtornos psiquiátricos.
O custo econômico dos transtornos psicossomáticos é alto, pela alta demanda de exames investigatórios negativos, além de ser frustrante para o médico e para o paciente. É necessário o trabalho de uma equipe multidisciplinar, que envolve o uso de medicamentos e psicoterapia.

Outras Parafilias

Entre outras parafilias menos comuns estão fazer telefonemas obscenos, esfregar-se nas pessoas para estimulação sexual em lugares públicos( frotteurismo), atividade sexual com animais( zoofilia), uso de estrangulamento ou anóxia para intensificar a excitação, preferência por parceiros com alguma anormalidade anatômica, busca incessante de lugares e correios eletrônicos relacionados com sexo, busca de relacionamento excitatório com cadáveres( necrofilia), manipulação e contemplação de material fecal( coprofilia), ingestão de excrementos( coprofagia), urinar, ser urinado ou beber urina( urofilia), estimulação e introdução de objetos na uretra feminina( uretismo sexual), preferência sexual por enemas( clisterfilia).

Pedofilia

A Pedofilia é uma parafilia e se caracteriza pela preferência sexual por crianças e pré-púberes. É raramente identificada em mulheres. Difere do incesto, no qual a vítima é mais velha. As atividades e fantasias sexuais são intensas e recorrentes. Há sofrimento clinicamente significativo. O indivíduo tem ,no mínimo, 16 anos de idade e é pelo menos 5 anos mais velho que a criança. Não deve envolver adolescentes para o diagnóstico.

Sadomasoquismo

O Sadomasoquismo é considerado uma parafilia e se caracteriza pela atração sexual aumentada em atividades com comportamento de servilismo e provocação de dor ou humilhação. No masoquismo o indivíduo funciona como o objeto. No Sadismo, o indivíduo funciona como o executor. Graus leves de sadomasoquismo são comumente aceitáveis para intensificar a atividade sexual normal.
O comportamento deve ser considerado anormal apenas se a atividade é fonte de estimulação mais importante ou é estritamente necessária para a satisfação sexual. Pode ser difícil distinguir o sadismo sexual da crueldade em situações sexuais ou de raiva não relacionada a erotismo.

Voyeurismo

O Voyeurismo é considerado uma parafilia e consiste no ato de olhar as pessoas envolvidas em situações íntimas ou sexuais. Geralmente é acompanhada por excitação e masturbação. Não há conhecimento da pessoa que está sendo observada. É de natureza persistente e recorrente.
O exibicionismo e voyeurismo são, em muitos aspectos opostos, combinados. O desempenho sexual é apático, com evolução mínima de 6 meses. Não há relatos em mulheres, manifestando-se antes dos 15 anos de idade. Pode ser uma prática aceitável, dentro de relacionamentos sexuais ativos, se não for substituto da atividade sexual.

Exibicionismo

O Exibicionismo é uma parafilia que se caracteriza pelo ato de expor os orgãos genitais a outras pessoas( usualmente sexo oposto) em lugares públicos. Não existe intenção de contato íntimo, mas aumentar a excitação. O ato é de natureza persistente e recorrente, comumente seguido de masturbação. Manifesta-se em períodos de estresse ou crises emocionais. Pode haver longos períodos sem o comportamento. A evolução mínima é de 6 meses. É limitado a homens heterossexuais. Para alguns exibicionistas, é a única atividade sexual. Há outros em que o exibicionismo ocorre dentro de uma vida sexual ativa e dentro de relacionamentos duradouros. Quando a pessoa para quem o exibicionista se expõe mostra-se chocada, assustada ou impressionada, a excitação do indivíduo é intensificada.

Fetichismo



O Fetichismo é considerado uma parafilia. Caracteriza-se pela utilização de alguns objetos inanimados como estímulo para excitação e satisfação sexuais. Os fetiches são extensões do corpo humano( artigo de vestuário e calçados), texturas( borracha, plástico ou couro). Os objetos-fetiche podem simplesmente ser meios para intensificar a excitação, para outras pessoas se transformam na maior fonte de estimulação( parafilia verdadeira). Quando há necessidade da presença dos objetos-fetiche para uma resposta sexual satisfatória estamos diante do fetichismo.
O Fetichismo é limitado quase exclusivamente a homens, sendo mais frequente em heterossexuais. Para caracterizarmos essa parafilia, a evolução mínima é de 6 meses, com sofrimento significativo na ausência do objeto-fetiche. Algumas pessoas praticam masturbação e alcançam o orgasmo de várias maneiras, seja vestindo o objeto, acariciando-o ou tendo contato oral com ele.
No travestismo fetichista, a excitação envolve o uso de roupas do sexo oposto. Podem ser usados a vestimenta completa, perucas, maquiagem. Há um forte desejo de tirar a roupa tão logo o orgasmo ocorra e a excitação declina. É encontrado comumente em fases precoces de transexualismo ou em travestis assumidos em fase precoce do desenvolvimento( por volta dos 10 anos de idade).

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Transtornos Psicosexuais



Os transtornos psicosexuais incluem a parafilias, os transtornos de preferência sexual, que se caracterizam por fantasias sexuais socialmente inaceitáveis, tornando-se exclusivos para a satisfação sexual. São comportamentos imperativos, repetitivos e estereotipados, com fantasias sexuais especializadas envolvendo objetos e situações incomuns.

O estresse aumenta a repetição dos atos parafílicos e o repúdio social aumenta a sua clandestinidade. Dependendo do parceiro sexual, pode ser considerada uma prática aceitável e alternativa de atividade sexual excitante. As parafilias são também conhecidas ,na linguagem leiga, como perversões e desvios. O início ocorre antes dos 18 anos de idade em 50 % dos casos.


Transtornos do Ciclo Menstrual



Na síndrome pré-menstrual , que acomete metade das mulheres, ocorrem sintomas mentais( alterações de humor), e sintomas físicos( cefaléia, mastalgias e inchaço), geralmente de intensidade branda. Ocorrem uma semana antes da menstruação.
No transtorno disfórico pré-menstrual aNegrito intensidade dos sintomas é maior, com predominância mental( irritabilidade, choro, impulsividade e ansiedade), acometendo mulheres de 25 a 35 anos, com comprometimento funcional maior que a síndrome pré-menstrual. O tratamento inclui antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina(ISRS).
Nos transtornos mentais da menopausa há queda da autoestima, piora dos sintomas depressivos, irritabilidade, ansiedade, problemas de memória, desconcentração e diminuição da libido. O início se dá entre 40 e 50 anos. O tratamento inclui acompanhamento ginecológico e psiquiátrico conjunto.

Transtornos no Puerpério



Os transtornos mentais agudos na fase puerperal são a psicose ou a depressâo. Elas se manifestam do 2º dia aos 3 meses depois do parto, com severidade variável.

A psicose pós-parto ocorre nas primíparas( primeira gestação) numa proporção de 1 para 500 gestações. No parto seguinte é de 1 para 3.

O risco de depressão pós-parto em primíparas de 10 a 15 %. O risco de recorrência é de 50 %.

Além desses quadros graves, a tristeza pós-parto atinge dois terços das puérperas, ocorrendo nos primeiros 10 dias do pós-parto e se caracteriza por irritabilidade, depressão, labilidade de humor, choro fácil,e indisposição geral.

O tratamento pode incluir o uso de antipsicóticos, estabilizadores de humor, antidepressivos e hospitalização para evitar o risco para a criança e para a mãe.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Terapia Cognitivo-Comportamental(TCC)


A TCC é uma modalidade de tratamento psicológico reconhecida pela sua eficácia em diferentes transtornos psiquiátricos. O modelo explicativo é fundamentado na teoria cognitiva, segundo a qual as emoções e comportamentos são determinados pela forma como o indivíduo interpreta o mundo.
O filósofo grego Epicteto já alertava para essa ideia: "Perturbam aos homens não as coisas, senão a opinião que delas têm."
A TCC ganhou impulso e desenvolvimento na década de 60 com os trabalhos de Beck, que estudava uma base empírica para o tratamento das depressões, independentemente do modelo psicanalítico de Freud, que acreditava na raiva retrofletida como etiológica na depressão. Beck observou que nem todos os pacientes possuíam essa característica, mas despertou a sua atenção muitas características mentais do pensamento negativo presente na doença depressiva. Em 1950, Albert Ellis propunha que as crenças irracionais( pensamentos distorcidos) eram a base dos desajustes mentais. Ele criou a terapia racional corretiva, cujo intuito era corrigir essas crenças e substituí-las por outras mais lógicas e adaptativas.
Beck então criou o primeiro modelo cognitivo da depressão, no qual concebeu a doença como uma perturbação no pensamento consciente, por causa do processamento cognitivo pessimista. Diferente do pensamento freudiano, que aborda o inconsciente, o modelo de Beck enfoca o consciente, isto é, os sintomas depressivos estariam no controle consciente do paciente, bastando ajudá-lo( com técnicas específicas) a corrigir a visão distorcida de si, do mundo e dos outros( tríade cognitiva).
A TCC constitui hoje numa modalidade terapêutica reconhecida pela sua eficácia em outros problemas como transtornos de ansiedade, transtornos de personalidade, hipocondria, transtornos alimentares, problemas com álcool e drogas, disfunções sexuais, esquizofrenia, casais com dificuldades conjugais.
O grande avanço da TCC é porque os modelos explicativos estão calcados no avanço da neurociência e isso dá longevidade ao modelo. A TCC também é perfeitamente compatível com o uso de psicofármacos associados. O trabalho terapêutico é mais ativo, com lições de casa, tarefas aplicadas a situações cotidianas, com uma participação mais ativa do paciente e do terapeuta, trabalhando cooperativamente. É diretiva, estruturada, educativa, de prazo limitado, com uma gama ampla de repertório de técnicas cognitivas, comportamentais ou mistas.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Relação Médico-Paciente



A relação médico-paciente é a base dos bons resultados terapêuticos. O terapeuta genuíno nunca se furta do amor às verdades. Cedo ou tarde, o paciente precisa aceitar as orientações do médico para aderir ao plano de tratamento. Se isso falhar, o resultado é o término da relação, com o paciente buscando outro profissional. Muitas escolas defendem que o resultado é determinado pelas técnicas específicas( linha teórica), outros acreditam que o vínculo terapêutico é mais importante que qualquer técnica empregada. Talvez seja o somatório dos dois fatores.
A maioria dos pacientes possui ideias pessoais quanto aos tratamentos e tenta exercer o controle direto ou indireto no plano terapêutico, seja questionando, seja colocando resistência quanto ao uso desse medicamento ou daquela modalidade terapêutica. O médico precisa contornar essa "resistência", através de um modelo explicativo claro, na linguagem acessível ao nível cultural do paciente. Usar linguagem técnica prejudica a compreensão da doença e o prognóstico. O melhor é adaptar a linguagem médica às características de cada paciente.
Mesmo depois das explicações dadas, o paciente ainda pode recusar-se a seguir as orientações médicas. É um direito seu, na contratação dos serviços, com exceção nos casos de risco iminente de vida. Aí o médico precisa agir mesmo contra a vontade do paciente.
Nas aulas de bioética que ministrei na universidade, sempre ressaltamos a autonomia do paciente, mas com as exceções. Quando houvesse uma doença mental em curso, que afetasse o juízo crítico , um familiar responsável deveria autorizar a internação compulsória. Nenhum familiar se sente confortável em fazer isso, mas se torna necessário devido às circunstâncias de risco para si e para terceiros.
No dia-a-dia dos atendimentos eletivos, sem a pressão das emergências, a relação médico-paciente é direta, o que demanda uma forte relação de confiança com o profissional escolhido. Muitas situações determinam essa afinidade médico-paciente, entre elas a compatibilidade de comunicação, a personalidade do médico, o conhecimento técnico e a capacidade do profissional construída na prática dos anos. Os verdadeiros conhecedores do "poder do médico" não são os colegas de trabalho, mas os pacientes atendidos, que fazem a divulgação gratuita do bom atendimento ou do mau atendimento. Médicos longevos na profissão contribuem de maneira verdadeira com a saúde dos seus pacientes. Esses médicos não precisam estudar relação médico-paciente nos livros, pois essa habilidade já se transformou numa segunda natureza. Tudo começa com a humildade de querer ajudar e atender muitos pacientes numa vida inteira de dedicação.
A relação médico-paciente moderna não está nos livros textos, nas teorias psicológicas controversas, na "superioridade" do médico vestido de branco, apartado do paciente por uma mesa cheia de troféus ou uma parede repleta de diplomas, mas no encontro de uma "dupla" cooperativa. Pacientes perambulam de consultório em consultório, buscam terapias alternativas, um padre ou pajé, porque o seu médico estava muito pouco empático com os sofrimentos humanos. A dor entorpece a sensibilidade do médico, mas a onipotência entorpece a alma. Uma boa relação médico-paciente é construída com respeito, aquele respeito que existia na época do nossos avós e ancestrais. Cada médico receberá a medida exata da sua evolução como pessoa nos relacionamentos humanos. Nem mais, nem menos!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Impulsividade

A Impulsividade pode ser um sintoma presente em diferentes transtornos psiquiátricos. A impulsividade pode ser um traço na personalidade. A impulsividade pode ser uma reação aguda numa situação de grande pressão e incertezas.

Fazer essa diferenciação é vital para melhor administrar essa característica ou sintoma. Se ela estiver presente num transtorno de humor(TAB) ou transtorno de déficit de atenção e hiperatividade(TDAH), o indicado é o uso de medicamentos reguladores da neurotransmissão. Dificilmente um componente de doenças com forte determinação biológica responde à força de vontade e disciplina. Há os "escapes'' em situações de grande estresse e demandas. É mais saudável bloquear esses ímpetos impulsivos com o uso de medicamentos. As pessoas se sentem impotentes frente à impulsividade crônica, por se tratar de um sintoma psiquiátrico. Da mesma maneira que não adianta pensar que controlamos tudo, abdicar do controle e procurar ajuda psiquiátrica alivia a culpa de ser incapaz de se controlar. Quanto mais cedo a pessoa afetada admitir que precisa de tratamento e se engajar ativamente , mais proteção terá contra as consequências da impulsividade.Os estabilizadores de humor(EH) são indicados no TAB e os antidepressivos e psicoestimulantes são indicados no TDAH.
Quando tratamos a impulsividade presente na estrutura de personalidade, portanto, um traço psicológico para lidar com a vida e afetos, a psicoterapia se converte na modalidade terapêutica de escolha. Existem inúmeras psicoterapias disponíveis. A TCC( terapia cognitivo-comportamental) possui técnicas eficazes para frear a impulsividade. Se a impulsividade for um sintoma de um transtorno de personalidade grave, como o Transtorno Borderline, uma psicoterapia a longo prazo e a associação de medicamentos são mais eficazes .
A impulsividade na reação aguda ao estresse é transitória, mas pode causar risco de consequências danosas. Portanto, o autoconhecimento e o controle emocional são necessários para modular as reações frente aos estímulos. Pessoas proativas são aquelas que escolhem uma resposta frente a um estímulo ameaçador. A grande maioria das pessoas reage , o que implica em pouca reflexão antes de responder a estímulos. As pessoas reativas estão no grupo de risco que faz coisas impensadas, das quais se arrependerão mais tarde. Se você é uma pessoa impulsiva, vale a pena entender o mecanismo envolvido e buscar tratamento.
Situações onde a impulsividade está presente e causa danos podem ser lembradas: usar arma no trânsito e ferir alguém numa discussão, dirigir de maneira agressiva e colocar vidas em risco, sexo sem uso de preservativo, abuso de drogas, envolvimento em brigas e perturbação da ordem pública, crimes passionais, humilhações e assédio moral, fofocas e mentiras, compras excessivas, agressividade verbal, sarcasmo e muitas outras variantes. Negligenciar esses sinais causa danos irreversíveis na vida de todos os envolvidos, vítimas e doentes!

domingo, 29 de novembro de 2009

Como se Instalam as Fobias- Outras causas



Falamos do modelo de Rachman. Mas existem outras explicações para as fobias específicas? Sim, existem. No modelo não-associativo, de Poulton et al, 2002, não haveria necessariamente uma associação de estímulo e resposta na instalação de fobias. Segundo esse modelo, uma pessoa com medos inatos, que são determinados geneticamente, quando expostos a situações naturais não-aversivas, sofrem uma extinção do medo no decorrer do tempo. Seríamos protegidos de desenvolver fobias toda hora. Um bebê brinca com o cachorro e se acostuma a considerar o cachorro um "estímulo neutro". Quanto mais experiências neutras tivéssemos na infância, menos fóbicos seríamos. Agora, pegamos um indivíduo predisposto geneticamente a ter medos, e esse indivíduo não tem a oportunidade de se expor naturalmente aos diferentes estímulos neutros( déficit), então ele pode desenvolver fobias! A insuficiência de exposição natural causou uma baixa auto-eficácia para lidar os estímulos neutros.

Somos evolutivamente preparados para desenvolver medo, porque o medo nos ajudou a sobrevivermos. Imagine na época das cavernas, você se expor ao ambiente hostil, com risco de ser devorado por um tigre! Qualquer coisa parecida com tigre nos dias atuais dispara nossa amigdala cerebral. Isso é adaptativo.

A pessoa vem de uma família de tímidos( altamente hereditário). Aí nunca teve a oportunidade de dar uma aula, fazer uma palestra, quando se levanta na sala de aula para ler um trabalho, já começa a suar frio, a tremer. Depois disso,nunca mais tenta superar essa dificuldade. Ele acaba reforçando o medo de falar em público. Não falar em público é um reforço negativo( evitação), pois ele evita as reações de medo, mas reforça a baixa autoeficácia na comunicação verbal. A timidez que carrega nos genes foi reforçada negativamente pela evitação fóbica, confirmando a sua ineficácia como palestrante! Um ciclo vicioso mantenedor da fobia.

De voux, no livro cérebro emocional, defende a ideia de que existem memórias fóbicas inconscientes, registradas( inprint), em nível cerebral amigdaliano, com características pré-verbais, portanto inacessíveis à psicoterapia verbal. Esses registros mnêmicos seriam estáveis e resistentes. Não adianta argumentar contra eles, pois as memórias verbais surgem a partir dos 4 ou 5 anos de idade, com o desenvolvimento do hipocampo. Nesses casos, técnicas vivenciais( comportamentais) são extremamente eficazes.

Então , não esquecemos as memórias traumáticas? Não, não esquecemos as memórias traumáticas. Modificamos a valência( importância) dessas memórias na nossa vida. Aí sim a psicoterapia entra como fator de tratamento. Através da interação verbal com o psiquiatra, você cria novas conexões neuronais em nível de neocórtex( parte mais evoluída do cérebro) e essa região passaria exercer um controle dos disparos neuronais da amigdala. Os traumas continuam na memória primitiva, mas o cérebro inteligente bloqueia os disparos dessa região, inibindo a evocação das memórias.

Como se Instalam as Fobias?



Quando nascemos, alguns reflexos são inatos. Se pegarmos um bebê recém-nascido e o colocarmos de barriga para baixo, com o rosto contra o colchão, ele vai desviar o rosto reflexamente depois de alguns segundos( fuga da asfixia), para respirar. Se colocarmos nosso dedo na mão do bebezinho, ele vai prender( reflexo de prensão) , assim por diante. Esses reflexos herdados evolutivamente são os reflexos incondicionados.

Podemos produzir fobias em laboratório, como foi feito no experimento do "pequeno Albert", onde uma criança foi exposta a bichinhos aos quais não demonstrava nenhum medo. O pesquisador então começou a disparar campainhas estridentes toda vez que um animalzinho aparecia. O pobre Albert, quero dizer, pequeno Albert, desenvolveu fobia dos animais. Bastava aparecer um animalzinho, que ele entrava em crise de ansiedade. Isso foi documentado em vídeo.
O primeiro pesquisador que estudou esse tipo de condicionamento, foi Ivan Pavlov, um cientista russo. Ele denominou essa reação de condicionamento de dois estímulos pareados( emparelhados) de condicionamento clássico. No condicionamento clássico, um estímulo incondicionado é associado com um estímulo neutro, provocando uma resposta condicionada. Vamos a um exemplo: no caso do experimento clássico, foi feito com um cão. O cão salivava, quando estava com fome( reflexo incondicionado). Então o cientista pareou uma campainha( estímulo neutro) com a salivação e criou uma resposta condicionada. Depois, basta tocar a campainha , que o cão salivava.
Agora vamos entender uma fobia específica. Temos um estímulo incondicionado( autopreservação, medo da destruição) e temos um estímulo neutro( chuva e trovões). Numa situação específica, a pessoa pode ter passado por uma experiência ameaçadora para sua vida, durante uma tempestade e acabou "relacionando" o estímulo neutro com a ameaça de destruição. Agora toda vez que se prepara o tempo para chuva, o organismo reage como se fosse ser destruído! Está criada a fobia!
As fobias são generalizáveis. Isso quer dizer que a pessoa pode começar com um objeto ou situação e ir mudando para outros objetos e situações correlacionadas. Muitas vezes não conseguimos chegar à origem da fobia, pois ela se transmutou no decorrer dos anos. Um exemplo interessante é o medo de travesseiro( de pena), oriundo de uma fobia inicial de medo de galinha. Tanto o travesseiro como a galinha possuem penas!. Por isso, não nos interessa muito saber a origem das fobias, mas sim a causa das fobias, para introduzirmos os tratamentos!
Outros fatores contribuintes na instalação de fobias são o condicionamento vicário e a transmissão de informações.
No condicionamento vicário, o indivíduo aprende um comportamento pela modelagem. Durante a exposição a objetos e situações fóbicas, aprende por imitação. Essa teoria vem de Bandura( teoria da aprendizagem social). Se o modelo( geralmente pais e cuidadores), selecionam uma resposta fóbica, a criança copia esse comportamento, instalando no seu modelo mental.
Na transmissão de informações e instruções, através do discurso de modelos, a pessoa pode anexar informações verbais tendenciosas na sua representação mental, gerando ansiedade decorrente das distorções. Pessoas com fobia do trânsito ou viagens, podem ter sido "orientadas" exaustivamente quanto ao perigo de acidentes, morte nas estradas e outras tragédias. Isso reforça o medo cognitivo ,com magnificação do risco imaginário,muito diferente do risco estatístico.
Em suma, segundo a teoria de Rachman, os três possíveis caminhos para a instalação de uma fobia são: o condicionamento clássico, o condicionamento vicário e transmissão de instruções, agindo sinergicamente para a o resultado patológico.